Pensar em arte e artesanato é pensar em histórias de vida. É pensar que, por trás de cada obra, há identidade, contornos de uma raiz. Ao contrário da produção industrializada, em série, que se engessa em comandos e padrões, o feito à mão é dotado da beleza de ser e pertencer. Quando mentes criativas empenham em objetos únicos suas habilidades e personalidade, a manifestação manual conquista uma fluidez que é seu próprio modo de significar. Com inúmeras técnicas e ramificações, esse tipo de trabalho se transforma como materialização sensível e esmerada do que brota na alma, herança do tempo, da cultura, e fruto da inspiração. São as sementes dos altos e corajosos voos da imaginação, que viaja sem limites para encontrar a liberdade de expressão.
Minas Gerais é celeiro de grandes nomes quando o assunto é o fazer artístico e artesanal. "São artistas que fazem peças lindas, estimadas até fora do Brasil, mas enfrentam dificuldades na comercialização, principalmente por causa dos atravessadores. Dessa forma, acabam não sendo reconhecidos e ficam sem o retorno desse esforço todo. Muitas vezes, a loja oferece o produto mas não faz a mínima questão de apresentar a trajetória do autor da obra para os clientes. E a maioria dos artesãos dedica a vida a isso", critica Cynthia Rabello, coordenadora do projeto Beagá Arte -Valorizando Quem Faz, um coletivo de artesãos e artistas plásticos mineiros.
É para mudar esse cenário que, já há algum tempo, ela vem promovendo a reunião entre atores dessa cadeia em eventos especiais, voltados para enaltecer e fazer acessível ao público a produção de cada um. Desde o início tímido na garagem de casa, Cynthia comemora quase cinco anos de projeto. "Pretendemos promover a união entre os atores da cadeia da arte e do artesanato. Convocamos o público para prestigiar a produção em Minas, valorizar o que a gente tem e faz", salienta.
Nesta toada, Cynthia convida para o 2º Encontro de Arte Mineira, que será realizado nesta quarta-feira, 16 de janeiro, entre 15h e 21h, no Sou Café, dentro do Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB), na Praça da Liberdade, em Belo Horizonte. Estarão reunidos 19 expositores que vão apresentar opções entre R$ 20 e R$ 300, com a assinatura de marcas locais.
Dentre o leque oferecido, estão ideias para uso pessoal, para enfeitar o lar e até gastronomia, como: design em resina por kasa.AORTA; joalheria artesanal por Cynthia Rabello e Gariglio Design; bordado à mão por Cruzes Décor; biscoitos com conceito por Analu Alves; bolsaria por Bruaca; pintura em madeira por feitoamao_bh; mobiliário, caixas e mandalas coloridos por Rafaela Pinturas; aquarelas por Estevão Machado; esculturas em cerâmica por Adolfo Viana; acessórios em cerâmica por Anna Tê; bijuterias com pedras por Joanna Kubitschek; alfaiataria feminina por Marizia Lage; ilustrações e colagens por Marise Pimenta; desenhos em nanquim, em destaque para a série Conexões, por Rosane Pimenta; papelaria artesanal por Arte de Maria; origamis por Ateliê Diadorim. Também marcam presença os produtos de moda elaborados pelo projeto social Libertees, que acontece na penitenciária feminina Estevão Pinto, em BH.
Muito antes do foco comercial, o evento no Sou Café busca convidar as pessoas a conhecer um pouco mais da coleção de artistas plásticos, artesãos e designers do estado. A partir das 19h, a casa abre as portas para o bate-papo literário com José Maria Rabêlo, jornalista e escritor, que irá discorrer sobre o livro recém-lançado História Geral de Minas. Na publicação que acaba de chegar às livrarias, o autor de 90 anos de idade narra a história da capital e de Minas Gerais desde a chegada dos primeiros habitantes, os antecedentes pré-históricos de 12 ou 13 mil anos atrás, até a atualidade. O relato contextualiza a formação do estado a partir da presença de indivíduos originários do nordeste da África. São capítulos escritos por José Maria Rabêlo (coordenador da obra), João Antônio de Paula, Fernando Correia Dias (falecido) e Ricardo de Moura Faria, com prefácio de Rui Mourão.
Cynthia, em conjunto com um time engajado de parceiros, acaba de inaugurar ainda um espaço fixo no Sou Café, para exposição e venda dos produtos artesanais, onde os encontros artísticos também devem ocorrer mensalmente. Abraçando diferentes modos de expressão como literatura, música, artesanato, artes plásticas e artes visuais, o propósito é criar uma identidade dentre desse que é um espaço privilegiado na cena cultural belo-horizontina. "Queremos sair um pouco do tom de feira. O objetivo é agrupar uma turma com trabalhos diferenciados, criativos, que chamem a atenção, além do retorno finaceiro. Trabalhos diversos que possam atender todo tipo de público. Costumo dizer que estamos no meio termo - não fazemos nem o artesanato simples e nem as obras de arte mais inviáveis e inacessíveis. Buscamos trazer a arte e o artesanato que sejam alcançáveis e que as pessoas possam consumir no dia a dia", diz Cynthia.
Para ela, na contramão de um mundo onde quase tudo é virtual, desde as fontes de entretenimento e saber até as próprias relações interpessoais, a sociedade começa novamente a procurar esse contato com a arte, no que se incluem os jovens. "É um retorno. Pretendemos ainda reunir jovens escritores, jovens ilustradores, mostrando para essa galera que é possível experimentar a arte e apreciá-la, conhecer um pouquinho da nossa história. E esse interesse tem ressurgido. Tanto que as exposições que acontecem dentro do CCBB encontram uma plateia jovem imensa", acrescenta Cynthia.
Para 2019, a pretensão do coletivo é também se tornar uma associação até o fim do primeiro trimestre, o que vai ajudar na visibilidade e abrangência de público. A perspectiva é de conseguir incentivo, novas formas de apoio, dar oportunidade aos artesãos de participar de diversas exposições, até em outros estados, em locais como centros culturais e museus, por exemplo, a preços de exposição acessíveis. O projeto já recebeu convite para participação em eventos em São Paulo e Rio de Janeiro. "A ideia é estabelecer um encontro de arte itinerante. Investir em uma divulgação maciça para ampliar o espectro de atuação dos artistas e artesãos, focando realmente na produção mineira. O importante agora é estarmos organizados", pontua.
Cynthia revela que não consegue viver sem criar. "É muito bom olhar para uma peça e dizer 'é isso! agora sou eu. consegui representar minha ideia'". Ela diz que um dos grandes desafios é conceber uma identidade que seja diretamente ligada ao trabalho, relacionar o nome à obra. "A pessoa olha para uma mesa cheia de coisa e sabe que aquela determinada obra é de tal artista. É difícil chegar nesse ponto", conta. E ela não se esquiva. “Nasci para isso, para reunir pessoas, para ajudar, orientar. Tem muita gente talentosa, mas que precisa de um direcionamento, o que eu ofereço gratuitamente. É o que eu gosto, é amor mesmo”.
No evento desta quarta-feira, a entrada é gratuita e a participação está sujeita a lotação. O projeto está com inscrições abertas para novos expositores. Quem tiver interesse pode procurar a coordenação para avaliação das peças e possível participação. O telefone é (31) 9.9511-9490 e também está disponível o endereço no Instagram @beagaarte, além da página do evento no Facebook.
2º Encontro de Arte Mineira 16 de janeiro de 2019 De 15h às 21h No Sou Café Centro Cultural Banco do Brasil Praça da Liberdade, 450, Funcionários - Belo Horizonte Entrada gratuita Sujeito a lotação