E agora, como fica?

CMBH aprova novo Plano Diretor após quatro anos de tramitação e muitas discussões

Texto mantém a outorga onerosa, item que divide opiniões contra e a favor

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Plano Diretor é o instrumento de planejamento do município que define critérios de ocupação do solo. Projeto aprovado estava em tramitação na Câmara desde 2015 - Yuran Khan/Divulgação Plano Diretor é o instrumento de planejamento do município que define critérios de ocupação do solo. Projeto aprovado estava em tramitação na Câmara desde 2015

A Câmara Municipal de BH aprovou em 6 de junho o novo Plano Diretor da capital, por 35 votos a favor e cinco contra. O plano tramitava nos corredores da câmara desde 2015 e foi motivo de muitas discussões e adiamentos. O projeto que visa o desenvolvimento urbano da capital impacta o setor de construção civil, além de facilitar a urbanização de ocupações e de preservar áreas ambientais. Apesar das críticas de setores da indústria, construção civil e de alguns vereadores, a limitação do coeficiente básico de aproveitamento em 1,0 e a outorga onerosa do direito de construir foram mantidos no texto.

De acordo com Geraldo Linhares Jr., presidente do Sindicato da Indústria da Construção Civil no Estado de Minas Gerais (Sinduscon-MG), alguns pontos do novo plano prejudicarão pequenas empresas do mercado civil na capital. Segundo ele, das 9 mil empresas credenciadas na entidade, 70% são de pequeno porte e são elas que mais sentirão os impactos do novo plano. “Vão impactar as pequenas, já que as grandes já migraram para outros mercados. As empresas de pequeno porte não têm políticas financeiras ou grandes capitais de giro. Vão sofrer igual o comércio vem sofrendo e muitos já estão fechando. É um retrocesso e inibe o progresso”, frisa.

De acordo com Fernanda Basques, presidente da Associação Brasileira dos Escritórios de Arquitetura (AsBEA), o plano diretor, conceitualmente, traz boas práticas urbanísticas. “O problema é quando traduzimos esses parâmetros em números”, defende. Segundo ela, o texto traz uma linha urbanística que prioriza a dispersão das centralidades. “Essa linha é contestada por muitos estudiosos que revelam impacto significativo para a economia das cidades, gerando perda de produtividade de aproximadamente 30%”, destaca. Para a arquiteta, o plano provocaria aumento no custo de obras, que serão repassados integralmente para imóveis, empurrando populações carentes ainda mais para a periferia.

Fernanda Basques cita que o Belvedere II e o Buritis são frutos de planos diretores mal pensados para a cidade. “A prefeitura acha que pode destinar o crescimento e o adensamento apenas com incentivos urbanísticos, não se preocupando com infraestrutura que suporte esse adensamento ou crescimento”, explica. Para ela, um plano diretor eficiente se faz com a participação de vários atores da sociedade, avaliando questões técnicas, econômicas, de infraestrutura, questões sociais, culturais, de mobilidade, entre outras. “Por isso, o plano precisa ser participativo porque não há uma especialidade que consiga entender todos esses assuntos e definir os melhores caminhos para a cidade. O plano tem que ser construído por muitas mãos”, comenta.

TAXA


O coeficiente de aproveitamento básico é uma regra que limita quanto um terreno pode ter de construção considerando o tamanho dele. Por exemplo, em um espaço de 100 metros quadrados será permitida uma construção do mesmo tamanho, ou seja, um imóvel de 100 metros quadrados. Caso o proprietário queira construir um imóvel acima disso, terá que pagar uma outorga onerosa para a prefeitura, que nada mais é do que uma autorização para uso do solo acima do coeficiente 1 de aproveitamento básico de terrenos.

De acordo com a arquiteta, a ferramenta da outorga deveria existir como contrapartida para compensar uma sobrecarga na infraestrutura por uma grande edificação. “A ferramenta foi desvirtuada e está com um caráter de expropriação, pois uma edificação pequena pode consumir facilmente o potencial construtivo de 1.0”, salienta.

Além disso, o presidente do Sinduscon alerta que é preciso ser efetivado um portal de transparência para a sociedade entender melhor o que farão com a arrecadação. “Muito do que está no texto do Plano Diretor dependerá de leis complementares e temos de fiscalizar todos esses pontos”, ressalta Geraldo Linhares. Após a aprovação do texto pelo plenário da Câmara, o texto segue para redação final e, depois, para a apreciação do prefeito Alexandre Kalil. 

RECONHECIMENTO DE OCUPAÇÕES URBANAS

Durante a votação na câmara para a aprovação do projeto muitos movimentos sociais estiveram presentes e favoráveis às medidas. Thales Viote, advogado popular e membro da coordenação nacional do Movimento de Luta de Bairros, Vilas e Favelas (MLB), avalia que o Plano Diretor traz avanços para a legitimidade de várias ocupações urbanas e que foram reconhecidas como área especial de interesse social (AEIS). “O que ratifica e reforça ao poder público aquilo que já era obrigatório, que é o reconhecimento de que tais regiões são importantes e estratégicas para o investimento de equipamentos públicos, urbanização e regularização fundiária, por se constituírem de habitações de interesse social, ou moradias populares, ou para ser mais didático ainda, de regiões onde moram pessoas com poder aquisitivo menor.”

O advogado cita que ocupações como a Eliana Silva e Paulo Freire, no Barreiro, e a Izidora, na Região Norte, são comunidades que se estabeleceram por conta própria, e essas regiões, de acordo com o Plano Diretor dos anos 90, não eram destinadas a receber moradia popular, sendo que suas antigas destinações não foram cumpridas por seus proprietários. “Com a aprovação do novo Plano Diretor, essas áreas estão sendo reconhecidas oficialmente como aquilo que elas realmente são na prática, ou seja, territórios de moradias populares”, afirma. Ele explica que as regiões ocupadas ficaram por décadas abandonadas, descumprindo o mandamento constitucional do artigo 182, §2º, segundo o qual “a propriedade urbana cumpre sua função social quando atende às exigências fundamentais de ordenação da cidade expressas no plano diretor”.

Thales também cita que houve bastante discussões sobre a outorga onerosa e inclusive campanha de fake news dizendo que se trataria de um novo imposto. “A outorga onerosa não tem nenhuma das características de tributo, por se tratar de medida de compensação pelos grandes ganhos e pouco retorno social da construção de grandes prédios, o que desagradou o empresariado”, segundo o advogado. Além disso, ele destaca que os recursos que se captarão com a outorga onerosa alimentará o Fundo Municipal de Habitação. De acordo com o projeto de lei, 25% da arrecadação destinada ao fundo deve ser usada na implantação de moradias populares. “Com isso haverá dinheiro para promover a regularização fundiária de várias ocupações, inclusive a Izidora, com a pavimentação de ruas, construção de redes elétricas e de saneamento, escolas, postos de saúde etc.”

O membro do MLB diz que há uma expectativa de que, em10 anos, na capital mineira, sejam construídas 25 mil casas na cidade, atendendo a média de 100 mil pessoas. “A partir de agora, é preciso pressionar o executivo para efetivar tais propostas”, finaliza.

* Estagiário sob a supervisão da editora Teresa Caram

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